Os últimos cinco anos foram uma montanha russa, pois inventei de voltar para a Universidade para cursar graduação em Direito. Não me esperem dizer que foi uma loucura, pois eu adorei cada segundo! Eu já vinha estudando Direito por conta própria desde quando fui Conselheira do CGEN e ajudei na redação da nova lei da biodiversidade e no Protocolo de Nagoya. Tive aulas com o então Professor Barroso na Escola Superior de Guerra e com o querido Professor Ives, o pai, além de vários outros juristas de peso, como o próprio Ministro Ayres Brito, na época, Presidente do STF. Saí da ESG toda Sissi, “sissintindo”, rsrs, a ponto de me matricular no concurso do Instituto Rio Branco na cara e na coragem. E não é que eu quase passei pela primeira fase? Aquilo me encorajou e me matriculei no curso Clio. Mas, aí, fui sondar com os amigos diplomatas que eu tinha e acabei mudando de ideia. Serviço público é serviço público e pelo menos o meu é na praia. Depois do Clio, fiz pós, MBA, mas eu sentia que faltavam pilares de sustentação mais básicos. Foi aí que a faculdade entrou. Para tapar buracos, amarrar estruturas. Talvez por isso tenha sido tão satisfatório. Assuntos os quais eu já sabia, mas não conseguia explicar, pois me faltavam conceitos básicos, se tornaram mais palatáveis. A decisão de voltar a fazer ciência nasceu daí.
É por isso que anuncio o meu primeiro artigo na área do Direito, com muito orgulho, não a hubris de se sentir, mas um sentimento maduro, de satisfação do dever cumprido. De tornar palatável um assunto complexo.
A ideia original era escrever sobre alguma lei associada à biotecnologia, mas a Universidade vetou. Nessa mesma época, o INPI publicou dados sobre pedidos divididos que pareciam uma fonte excelente de análise de uma hipótese que eu já vinha elaborando e sobre a qual até já escrevi. Eu já vinha incomodada com a questão dos pedidos divididos desde 2009 mais ou menos. Na época, o artigo 32 em pedidos divididos era o assunto da moda e eu não entendia o porquê, pois nas minhas palavras na época: “eu não me lembro de ter visto 32 em pedido dividido”. Me lembro da falecida procuradora Maria Alice vir conversar comigo pois ela também estava encucada com o assunto, pois entendia que o 32 não era um artigo finalístico, mas processual. Na época, artigo finalístico e processual eram palavras alienígenas e sem sentido para mim. Só mais tarde, em 2016, que eu fui entender a confusão. Nessa época, eu tinha sofrido um aborto espontâneo e estava muito abalada emocionalmente. Quando voltei de licença, pedi ao meu chefe tarefas mais simples e me foram repassados uns pedidos divididos indeferidos pelos 32, todos iguais. As petições eram, literalmente, idênticas. Argumentavam que os pedidos tinham uma nova data de depósito e nova data de pedido de exame, o que era um fato. Mas, o artigo 27 prevê data de depósito ficta para pedidos divididos. Mas, não para pedido de exame... Foi construindo a argumentação para responder a esses pedidos que a ficha caiu: a divisão por depósito está criando confusão... algo de errado não está certo.
Escrevi um pequeno relatório com minhas impressões e mandei hierarquia acima. Fui ouvida? Claro que não. Gosto muito de uma frase de Schoppenhauer: “Toda verdade passa por três estágios. No primeiro, ela é ridicularizada. No segundo, é rejeitada com violência. No terceiro, é aceita como evidente por si própria.". Schoppenhauer é um filósofo depressivo? É. Mas, ele não deixa de ser certeiro. Toda a vez que apontamos o dedo para o status quo, somos atacados. Já estou até ficando acostumada, hehe
Pois bem. Quase 10 anos depois, segue a demonstração científica do que antes eram, apenas, as minhas impressões. As conclusões do artigo são simples: a divisão de um pedido por um procedimento de depósito cria confusões. Confusão acerca da data de depósito, confusão para com a dupla proteção e, claro, confusão para com o artigo 32. Há outras confusões também, mas estas ficarão para outros artigos científicos, rsrsrs Por ora, fica a lição de que dividido tem que dividir, que essa divisão é material, e que isso deve ser verificado antes da divisão ser aceita e se tornar um pedido dividido propriamente dito.

O artigo pode ser acessado aqui, no site da Revista Digital de Direito Administrativo da USP, e os anexos podem ser baixados aqui:
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