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PODE ALGUÉM QUE LEU A MINHA TESE PATENTEAR A MINHA INVENÇÃO E DEPOIS ME IMPEDIR DE USÁ-LA?


Via de regra uma tese de doutorado é pública. E isso também vale para Dissertações de Mestrado ou Monografias e Trabalhos de Conclusão de Curso, os chamados TCC. Salvo raríssimas exceções em que a defesa é feita de forma sigilosa. Essas apenas ocorrem justamente quando há de fato o interesse em patentear o objeto da tese. Nesse caso, além da defesa ser restrita à banca, é costume também a assinatura de um acordo de sigilo e não divulgação. Por que todo esse cuidado?


Porque uma vez publicada a tese - e isso vale para qualquer documento - ela passa a fazer parte do estado da técnica. O estado da técnica vale para o mundo inteiro! Isso não impede ninguém de tentar. Então, a resposta à pergunta é SIM – alguém pode tentar patentear a sua invenção e solicitar um pedido de patente. Mas, um pedido de patente não é uma patente, é apenas uma expectativa de que uma patente será concedida um dia... Ele também pode ser negada. A concessão de uma patente não é automática, ela é condicionada a um exame técnico que verificará se aquele pedido atende aos requisitos legais. Durante esse exame, uma das tarefas primordiais do examinador é determinar o estado da técnica. Adivinhe o que vai acontecer quando ele fizer isso? Voilà! Vai encontrar a tese original que o levará a concluir que aquele pedido não contém matéria nova, um dos requisitos de patenteabilidade. Em consequência, o pedido será negado. Então, a resposta imediata à sua pergunta é NÃO. SIM - alguém pode tentar patentear a dissertação/estudos e NÃO - esse alguém não tem o direito de patentear porque não é matéria nova.


Só que essa resposta só é válida, claro!, no mundo ideal, rsrs Um examinador do país onde a tese foi publicada provavelmente vai incluir uma busca no banco de teses nacional durante a determinação do estado da técnica, mas é extremamente improvável que examinadores de outros países também façam isso. Inclusive porque as teses são normalmente escritas em língua local. É difícil para um examinador japonês ter acesso à uma tese brasileira, escrita em português, por exemplo.


Assim, no mundo real é possível vislumbrar dois cenários: no primeiro, como o examinador não encontrou a tese durante a busca vai concluir, equivocadamente, que o pedido é novo. Se os demais requisitos também forem cumpridos, é possível que o examinador acabe por conceder essa patente... Nesse caso, a patente, por ter sido concedida com vício, é nula e qualquer um, incluindo o autor da tese, pode solicitar a sua nulidade ou revogação enviando ao escritório de patentes uma cópia do documento que antecipou a tecnologia, no presente exemplo, a tese de doutorado. Aliás, antes mesmo da concessão, você, ou qualquer outro interessado, pode dar uma forcinha ao examinador enviando esse documento. O nome é diferente por ser antes da concessão, mas a lógica é a mesma. No Brasil, essa ação se chama Subsídios ao exame técnico. No Instituto Europeu de Patentes, se chama Pre-Grant Third-Party Observation.


Entretanto, ainda no âmbito do mundo real, publicar somente a tese de doutorado é muito, muito raro. O mais provável é que o conteúdo da tese também seja publicado na forma de um artigo em alguma revista científica, em um periódico ou até mesmo um livro. Nesse caso, é muito mais difícil que o examinador de patentes deixe passar esse documento porque os artigos científicos são comumente indexados em bancos de dados que são frequentemente buscados. Pode acontecer de ainda assim o examinador não encontrar? Sim, pode. Difícil, mas pode. E aí, vale a mesma regra: subsídios técnicos ao exame na fase de pedido ou, se a patente já tiver sido concedida, nulidade/pedido de revogação.


Existem empresas cujo trabalho é justamente garantir que a informação tecnológica seja encontrável. Elas buscam documentos em várias fontes, fazem resumos traduzidos, marcam os documentos com palavras-chave, criam algoritmos de busca ... tudo para aumentar a chance do buscador encontrar exatamente aquilo que ele procura. Não à toa essas empresas cobram fortunas. E tem empresas que pagam por esse serviço. Porque ninguém quer re-inventar a roda! Já pensou gastar uma fortuna inventando, depositando um pedido para, mas à frente, ver o seu pedido ser negado? Ou então concedido, mas depois a patente ser anulada/revogada? Ou ser proibido de vender a sua própria tecnologia em algum território? Por isso, nunca é demais repetir: uma busca detalhada é a chave para se entrar no mundo das patentes! Os escritórios de patentes – pelo menos os grandes – também pagam para ter acesso a essas bases. A Derwent é um exemplo.


Por fim, respondendo diretamente à pergunta: PODE ALGUÉM QUE LEU A MINHA TESE PATENTEAR A MINHA INVENÇÃO? Ele pode tentar. E se conseguir, pode, sim te impedir de usar a sua própria invenção. Mas, você pode contra-atacar informando ao escritório de patentes sobre a existência de um documento anterior. Então, patentear a tese de alguém não é algo recomendável a se fazer, Rsrs


Antes de terminar, quero apenas fazer duas provocações: a primeira - e se o depósito do pedido for anterior à data da publicação da tese - data da defesa pública - nesse caso, então, há o direito, em teoria, à patente. Digo, em teoria, porque pode ter havido roubo, furto, violação de acordo de confidencialidade... mas aí já entramos em outros ramos do Direito que não são o objeto desta página. Se o acesso ao conteúdo tiver sido legítimo, o primeiro a depositar tem o direito à patente. E, hoje em dia, é assim até nos Estados Unidos: não adianta alegar "Eu inventei primeiro".


A segunda provocação é que outros podem melhorar a sua invenção. E se essa melhoria não for óbvia, é possível obter, sim, uma patente sobre essa invenção, agora nova e em versão melhorada! Mas aí já estamos falando de outro requisito de patenteabilidade... atividade inventiva! Rsrs E esse fica para um próximo post!


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